Páginas

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Lembranças de Vlado

Hoje, se estivesse vivo, Vladimir Herzog, o Vlado, completaria 74 anos. Se estivesse vivo, talvez não teria sido um marco para a história nacional. Uma vida precisou ser sacrificada, para que a luta por democracia, durante a Ditadura Militar brasileira, fosse fortalecida e crescesse no âmbito nacional. Qualquer um que estudou história do Brasil na escola ouviu falar no Vlado. Mas, uma figura importante que mesmo após a morte se fez notar merece ser lembrado.


Herzog nasceu na antiga Iugoslávia, em 27 de junho de 1937. Filho de Zigmund Herzog e Zora Herzog, imigrou com os pais para o Brasil em 1942. A família saiu da Europa fugindo do nazismo. Vlado foi criado em São Paulo e se naturalizou brasileiro. Fez Filosofia na USP e tornou-se jornalista do jornal O Estado de S. Paulo em 1959.

No início da década de 60, casou-se com Clarice. Com o golpe militar de 1964, o casal resolveu passar uma temporada em Inglaterra e Vladimir conseguiu trabalho na BBC de Londres. Voltando ao Brasil, Vlado trabalhou um ano em publicidade, depois na editoria de cultura da revista Visão. Em 1975, foi escolhido pelo Secretário de Cultura de SP, José Mindlin, para dirigir o jornalismo da TV Cultura.

Um jornalista que sabia, como muitos daquela época, o quanto os militares estavam dispostos a eliminar (literalmente) qualquer ação ou forma de oposição. Mas, sua carreira política, - apesar de ser filiado ao Partido Comunista, proibido e perseguido durante o regime militar- , era feita de forma branda, a comparar com muitos revolucionários da época.
Na noite do dia 24 de outubro de 1975, o jornalista apresentou-se na sede do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações/ Centro de Operações de Defesa Interna), em São Paulo, para prestar esclarecimentos sobre suas ligações com o PCB. No dia seguinte, foi morto aos 38 anos.

Segundo a versão oficial da época, ele teria se enforcado com o cinto do macacão de presidiário. Porém, de acordo com os testemunhos de Jorge Benigno Jathay Duque Estrada e Rodolfo Konder, jornalistas presos na mesma época no DOI/CODI, Vladimir foi assassinado sob torturas. Como Herzog era judeu, o Shevra Kadish (comitê funerário judaico) recebeu o corpo e, ao prepará-lo para o funeral, o rabino percebeu que havia marcas de tortura no corpo do jornalista, prova de que o suicídio tinha sido forjado.

Em 1978, o legista Harry Shibata confirmou haver assinado o laudo necroscópico da vítima - na qualidade de segundo perito - sem examinar ou sequer ver o corpo. Em 1978, a Justiça responsabilizou a União por prisão ilegal, tortura e morte do jornalista. Em 1996, a Comissão Especial dos Desaparecidos Políticos reconheceu que Herzog foi assassinado e decidiu conceder uma indenização para sua família.

Dados
Enquanto durou, de abril de 1964 a março de 1985, o regime militar produziu pelo menos 3,5 mil vítimas entre mortos, torturados, presos e banidos. Em 1972, morreram 33 homens e 5 mulheres nos porões da ditadura e em confrontos de guerrilha urbana. No ano seguinte, 28 pessoas foram mortas.

Em 1975 a imprensa entrou na mira do regime. Quando intimaram Herzog no dia 24, 11 jornalistas já estavam presos no DOI-CODI: Sérgio Gomes, Marinilda Marchi, Frederico Pessoas da Silva, Ricardo de Morais Monteiro, José Póla Galé, Luiz Paulo da Costa, Anthony de Cristo, Paulo Sérgio Markun, Diléia Markun, George Duque Estrada e Rodolfo Konder.

A morte de Vlado não foi a única, mas também não foi só mais uma em milhares. Foi uma tapa na cara naqueles que acreditavam que a violência poderia calar eternamente e que esta solucionaria todos os problemas. Foi uma mostra de como inocentes eram submetidos a tratamentos cruéis por pensar diferente. Existiram outros Vlados e ainda existem. A cada inocente que é morto por protestar contra o desmatamento no norte do país, por denunciar esquemas de corrupção. Cada um destes é um Vlado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário