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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Robinson Cavalcanti - vai fazer falta


Infelizmente esta semana começou com uma notícia muito triste: a do falecimento do bispo anglicano Robinson Cavalcanti. Deixando o tema religião de lado, já que este não é o foco deste blog, queria, através deste post, ressaltar a importância sócio-política que este homem teve para o país.  Apesar de seguir a carreira religiosa, não descuido e ficou ausente em outras áreas, sendo um atuante escritor, educador, sociólogo e político.


Nascido em Recife, em 1944, filho de um empresário, também político,  Dom Edward ROBINSON de Barros CAVALCANTI começou desde novo a se engajar politicamente, participando do Grêmio do Colégio e da União dos Estudantes Secundaristas de Alagoas (UESA). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e com licenciatura em Ciências Sociais na Universidade Católica de Pernambuco, Robinson Cavalcanti assumiu, na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), vários cargos altos - foi coordenador de graduação, de pós-graduação e de mestrado, chefe de Departamento, além de diretor do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFPE. Robinson Cavalcanti também atuou nas campanhas presidenciais de Lula, de 1989 e 1994, e também foi candidato a vice-prefeito de Olinda (1996). Lecionou por 35 anos.


Foi candidato a Deputado Estadual, em 1982, pela oposição ao Regime Militar (e membro do Diretório Municipal do PMDB do Recife), e participou das campanhas pela Anistia e pelas ‘Diretas Já’. Foi Presidente da OMEB - Ordem dos Ministros Evangélicos do Brasil - Secção de Pernambuco, e um dos idealizadores e membro da primeira diretoria nacional do MEP - Movimento Evangélico Progressista. Participou da campanha do “Parlamentarismo” e da campanha pelo “Fora Collor”.


Em entrevista para o Jornal Extra de Pernambuco, contou como via o sistema político brasileiro atual e como sentiu o golpe militar de 1964.


A íntegra da entrevista você pode conferir clicando aqui. Selecionei alguns trechos importantes, extraídos do blog do jornalista Jénerson Alves.


“No momento em que estávamos vivenciando a ditadura, eu fui desafiado por líderes evangélicos no Brasil, porque havia duas coisas. Primeiro: o mundo protestante sempre foi participante da política, desde a sua chegada ao Brasil, em 1855, quando os protestantes não tinham direito à liberdade religiosa e nem podiam votar. Mas, com o decorrer da história, a proclamação da República, separação de Igreja e Estado, essa participação foi crescente, até o Golpe de 1964.

Durante a ditadura militar, os setores que controlaram a Igreja fizeram uma espécie de amnésia compulsória. As gerações novas não conheceram nem os nomes nem os episódios da participação política dos evangélicos no Brasil e – obviamente – também em escala mundial. E também deixou de se ensinar, da Bíblia, a parte sócia, a parte política. Havia essa grande lacuna.”

Assim, eu escrevi o livro. Depois que escrevi o livro, não consegui editora. As editoras cristãs na época temiam que fosse publicado.

“E nós lamentamos que os evangélicos que foram tão participantes no passado, fizeram reticências inclusive ao regime militar, quando a CNBB chegou a soltar uma nota saudando o Golpe, ele tinha sido de certa maneira cooptado pelo regime, saindo da cena política. Quando o movimento evangélico volta à política depois da democracia, ele volta sem referenciais teóricos. Isso faz com que hajam muitos escândalos, muita prática que não condiz com a tradição, porque eles entraram no jogo comum da política brasileira, do toma-lá-dá-cá, do clientelismo, que encoraja grupos minoritários que estão preocupados, porque tanto no regime militar do Brasil vários grupos que encorajavam o engajamento evangélico na política está uma coisa muito utópica, e tem havido muitos escândalos. Um exemplo é a oração pela propina lá em Brasília, que vem distante dos ideais nossos, cristãos, não é?
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Ao todo são mais de 1.000 artigos sobre Teologia e Ciência Política, publicados no Brasil e no Exterior. Atuou, também, na rádio e na televisão, em programas religiosos e políticos, passando a dar conferências no país e no exterior, principalmente na área de Ética Social.


Faleceu tragicamente, no último dia 26 de fevereiro, assassinado pelo filho adotivo Eduardo Olímpio Cotias Cavalcanti, usuário de drogas que também matou a esposa de Robinson, Miriam Nunes Machado Cotias Cavalcanti, e tentou suicídio.


Uma grande perda para o meio intelectual e social.

Abraços.








segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Araguaia - a história de uma luta

Olá!

Estava preparando um post sobre a matéria da Folha de São Paulo, sobre a entrevista com o fotógrafo da cena do suicídio fajuto de Vladimir Herzog, quando, em minhas pesquisas, achei esse documentário. Camponeses do Araguaia: A Guerrilha vista por dentro, mostra a visão dos camponeses desta área, sobre a Guerrilha do Araguaia. Aí, lembrei que não tinha feito nenhum post sobre isso.


Durante a ditadura militar, vários partidos e organizações de esquerda optaram pelo caminho da luta armada. Tanto nas cidades como no campo, essa "oposição armada" ao regime marcou profundamente a história política recente do Brasil. No caso dos conflitos rurais, o mais importante - e até hoje mais controverso - foi a chamada Guerrilha do Araguaia.


Ocorrida no início da década de 1970, a guerrilha levou este nome por ter sido travada em localidades próximas ao rio Araguaia, na divisa entre os atuais estados do ParáMaranhão eTocantins (na época, pertencente ao Estado de Goiás). A guerrilha foi organizada pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B), que, desde meados dos anos 1960, já mantinha militantes na região do conflito.


A versão mais aceita dá conta de que a guerrilha, ainda não deflagrada, teria sido descoberta pelos militares através de informações passadas por uma militante do PC do B. Foi assim que, em abril de 1972, o Exército chegou à região à procura dos guerrilheiros, que viviam misturados à população local.

Naquele momento, praticamente 70 militantes do partido moravam na região, trabalhando como agricultores, farmacêuticos, professores e comerciantes. Para não chamar a atenção, o grupo não se envolvia com questões políticas. Por isso, dada a sua integração, foi com grande surpresa que a população local recebeu a notícia de que eram acusados de atividade subversiva.

Apesar de serem infinitamente mais fracos que o Exército, os guerrilheiros conseguiram resistir por quase dois anos às perseguições. Os militares precisaram de três campanhas para, finalmente, encerrar o conflito na região do Araguaia, em dezembro de 1973, com a destruição da Comissão Militar. Daí em diante, as perseguições continuaram, mas a estrutura da guerrilha já estava completamente desmantelada.


O conflito do Araguaia terminou com um trágico saldo: foram cerca de 76 mortos, sendo 59 militantes do PC do B e 17 recrutados na região. Também por isso, acabou se transformando no principal confronto direto entre a ditadura militar e a esquerda armada. Ocorrida sob intensa censura, a guerrilha nem mesmo chegou ao conhecimento da população em geral, o que só ajudou a isolar ainda mais os militantes do PC do B.

A confirmação da existência da guerrilha na região por parte do governo só veio tempos depois de encerrado o conflito. A perseguição aos guerrilheiros, segundo testemunhos de militares que participaram da operação, moradores do local e sobreviventes, teve requintes de crueldade, como decapitação e fuzilamento.



Assista abaixo o documentário, da série Caminhos da Reportagem, Guerrilha do Araguaia. Reportagem: Emerson Pena e Paula Simas, edição: Floriano Filho.



Um processo foi instaurado contra a União, em 1982, por vinte e dois parentes de guerrilheiros, que por meio dele pediram à Justiça que o Exército brasileiro apresentasse documentos para que pudessem obter atestados de óbito.Ocorre que, tendo os guerrilheiros atuado na clandestinidade, com nomes e documentos falsos, não foram localizados documentos comprobatórios dos óbitos.


Em 22 de julho de 2003, o Diário da Justiça publicou a decisão da juíza Solange Salgado, da 1ª Vara Federal do Distrito Federal, ordenando a quebra de sigilo das informações militares sobre a Guerrilha do Araguaia, dando um prazo de 120 dias à União para que fosse informado onde se encontram sepultados os restos mortais dos familiares dos autores do processo, assim como rigorosa investigação no âmbito das Forças Armadas brasileiras.


Em 27 de agosto de 2003, a Advocacia-Geral da União apelou da sentença que determinou de abertura dos arquivos, embora reconhecesse o direito dos autores de tentar localizar os restos mortais de seus familiares desaparecidos. Pressionado e sensibilizado, o governo Lula criou em 3 de outubro de 2003 uma comissão interministerial para localizar restos mortais. Esta comissão solicitou os documentos, sendo informada de que os mesmos não existiam.


Atualmente, após passar pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, o processo voltou à justiça de primeira instância para a fase de cumprimento de sentença. O processo está sob apreciação da Juíza Federal Solange Salgado.


Em abril de 2009, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA) que cuida da observância dos direitos humanos nos países pertencentes à organização, abriu uma ação contra o governo brasileiro por detenção arbitrária, tortura e desaparecimento de 70 pessoas - entre guerrilheiros, moradores da região e camponeses ligados à Guerrilha do Araguaia durante a ditadura militar brasileira. Em dezembro de 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos acatou a denúncia da CIDH e puniu o Estado brasileiro por utilizar a lei de anistia como pretexto para não julgar os oficias que infringiram a lei durante a repressão à guerrilha.